a t a r a x i a.
— Ok. Estou aqui. Qual é a emergência? — ele disse, fechando a porta ao mesmo tempo em que tentava tirar a gravata.
Do sofá, ela sorriu, marota. Ao contrário dele, estava de pijama. Isso seria completamente normal, se o tecido não estivesse repleto de gatinhos mostrando a língua. Típico.
— A emergência está bem na sua frente. — Ela apontou para a televisão, que exibia o título de um anime, pausado. Esperando por ele, é claro.
Ele suspirou, incrédulo, enquanto largava a pasta cheia de papéis na primeira poltrona que viu.
— Isso é serio?
— Muito sério. E já disse pra deixar as pastas no escritório, não espalhadas na sala! Some com isso. Agora.
— Inacreditável.
— Você está atrasado e ainda vem reclamar? — Ela balançou a cabeça. — Troca a roupa enquanto eu pego os cookies no forno. — Ela levantou do sofá, indo para a cozinha, enquanto ele fazia menção de ir para o quarto. — E leva a pasta!
— Inacreditável — ele repetiu, pegando o objeto com impaciência.
— Mas se quiser pode deixar que eu cuido de tirar as roupas — pronunciou, lutando com o constrangimento interno e esgueirando-se para dentro da cozinha enquanto ele ria.
— Você fica mesmo muito sexy com esse pijama — ele elevou a voz, certificando-se de que ela iria escutar.
Finalmente foi se trocar. Não antes de deixar a pasta no escritório, é claro.
Ao contrário dela, ele não tinha nenhum pijama de gatinhos mostrando a língua, apenas uma série de camisetas lisas, moletons e bermudas. Do outro lado do armário, a sua coleção de ternos, gravatas, camisas sociais e sapatos perfeitamente alinhados. Mas isso era coisa dela, não dele.
Seu corpo estava um tanto dolorido pelo dia puxado na empresa. Os funcionários tinham dado um pouco de incômodo naquele dia, mas as coisas se resolveram. Normalmente era ela que cuidava dos funcionários, mas aquele era o seu dia de folga, então o trabalho ficou um pouco mais pesado. O comum era os dois trabalhando juntos.
Ele ainda estava com uma parte do pensamento nas reuniões da semana e nas viagens a Nova York daquele mês, quando ouviu os pedidos insistentes de "vem logo!" da sala de estar. Meu Deus, como ela parecia uma criança às vezes. Ele pegou a camisa e foi colocando-a enquanto ia para a sala. Ela mastigava um cookie, sentada no sofá, com um edredom (que parecia ótimo para relaxar, ele tinha que admitir) e o controle remoto na mão.
— Então, qual é a tortura de hoje? — Ele sentou do lado dela, colocando o pote com cookies na mesinha de centro.
— Shingeki no Kyojin. — Ela cobriu-o com o edredom e encostou a cabeça no ombro dele, sentindo o cheiro do perfume rotineiro que acompanhou seus pensamentos no decorrer do dia. — Senti sua falta — disse, mordendo o pescoço dele.
— Eu também senti a sua. — Ele beijou a testa dela enquanto lhe abraçava.
O momento era tão oportuno. Tão certo. E tão simples. Era até assustador o quanto eles se completavam.
Tirando o fato de que ele não suportava assistir animes, mas isso era o de menos.
Ela ia reproduzir o episódio quando ele começou a beijar sua bochecha. Sabia que em questão de instantes ela viraria o rosto, beijaria a boca dele, depois o pescoço, então levantaria a camiseta dele para facilitar os arranhões, e ele faria questão de jogar a calça do pijama de gatinhos no chão. Questão de instantes até o edredom escorregar, o controle remoto cair e os cookies serem esquecidos na mesinha de centro.
Mas é claro que mais uma tentativa de cinema caseiro frustrada não era motivo para ela reclamar; apenas resmungar levemente.
Ela suspirou com os beijos molhados e murmurou, já um tanto fora de órbita:
— Shingeki no Kyojin fica pra amanhã?
Ele sorriu e mordiscou a orelha dela. Então havia a possibilidade de um "amanhã".
— Amanhã. — A palavra soou bem. — Prometo.
Dito isso, ergueu a mão para encontrar o interruptor e apagou a luz.
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Ataraxia: Termo grego para um estado lúcido, caracterizado pela ausência de preocupação. Para os epicuristas, a ataraxia era sinônimo da única verdadeira felicidade possível para uma pessoa.
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